A transferência internacional de dados é um desafio crescente para empresas que operam globalmente. Com a evolução das regulamentações, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR), as organizações precisam garantir que seus fluxos de dados estejam em conformidade com padrões rigorosos de segurança e privacidade.
Entre as alternativas regulatórias disponíveis para viabilizar essas transferências, as Normas Corporativas Globais (NCG) surgem como um modelo robusto, especialmente para grandes empresas que movimentam um alto volume de dados entre países. Mas como essas normas funcionam na prática? Qual a diferença entre elas e as cláusulas-padrão contratuais? Será que a sua empresa poderia se beneficiar desse modelo?
Neste artigo, explico detalhadamente o conceito das Normas Corporativas Globais, o processo de reconhecimento pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e como sua adoção pode ser vantajosa para determinadas organizações.
O que são as Normas Corporativas Globais (NCG)?
As Normas Corporativas Globais (NCG) são regras internas adotadas por um grupo empresarial para garantir a proteção de dados pessoais dentro da organização, independentemente do país onde a operação ocorre. Essas normas estabelecem um conjunto de diretrizes de privacidade, segurança e governança de dados, garantindo que todas as subsidiárias ou afiliadas da empresa sigam os mesmos padrões.
Diferente das cláusulas-padrão contratuais, que são acordos específicos entre duas partes distintas, as NCG são regras organizacionais criadas para viabilizar o fluxo contínuo de dados entre empresas de um mesmo grupo econômico. Dessa forma, a proteção de dados é assegurada de forma uniforme em todas as unidades da empresa ao redor do mundo.

As NCG são especialmente úteis para multinacionais e grupos empresariais que possuem escritórios, fábricas e operações em diferentes países. Ao implementar essas normas, a organização demonstra um compromisso global com a privacidade, facilitando suas operações internacionais.
Entre os principais pontos abordados pelas Normas Corporativas Globais, estão:
- Princípios de tratamento de dados – Definição clara sobre como os dados são coletados, processados e compartilhados dentro do grupo empresarial.
- Direitos dos titulares – Mecanismos internos para que clientes, funcionários e parceiros possam exercer seus direitos, como acesso, retificação e exclusão de dados.
- Medidas de segurança – Definição de protocolos e padrões para proteção contra acessos não autorizados e vazamentos.
- Mecanismos de fiscalização – Procedimentos internos para auditorias e conformidade com as regulamentações locais e internacionais.
- Responsabilidade e governança – Estrutura organizacional clara, indicando quem são os responsáveis pelo cumprimento das normas dentro da empresa.
As NCG são amplamente reconhecidas como uma solução viável para empresas globais que precisam de maior flexibilidade na transferência de dados entre países, sem depender exclusivamente de cláusulas contratuais ou de decisões de adequação.
Como a ANPD reconhece as Normas Corporativas Globais?
No Brasil, a Resolução CD/ANPD nº 19/2024 regulamenta as Normas Corporativas Globais e estabelece critérios para que elas sejam reconhecidas oficialmente como um mecanismo válido para a transferência internacional de dados.
Para obter essa certificação, a empresa precisa submeter suas normas para análise da ANPD, comprovando que as regras internas garantem um nível adequado de proteção, compatível com os princípios da LGPD.
O processo de aprovação envolve:
- Submissão da documentação – A empresa precisa apresentar suas Normas Corporativas Globais à ANPD, detalhando como os requisitos da LGPD são atendidos.
- Avaliação técnica – A ANPD analisa as normas, verificando se elas garantem proteção suficiente para os dados transferidos.
- Decisão da autoridade – Se as normas forem consideradas compatíveis com a LGPD, a ANPD pode autorizar a empresa a utilizá-las como base legal para a transferência de dados.
- Monitoramento contínuo – Empresas certificadas precisam manter relatórios e auditorias regulares para garantir que continuam cumprindo os requisitos exigidos.
A principal diferença entre as NCG e as cláusulas-padrão contratuais é que as NCG são regras internas, aplicáveis a todas as subsidiárias da empresa, enquanto as cláusulas-padrão são acordos firmados entre duas partes específicas. Dessa forma, as Normas Corporativas Globais oferecem mais autonomia e eficiência para empresas que operam em múltiplos países.
Quais empresas podem se beneficiar desse modelo?
As Normas Corporativas Globais são indicadas para grandes grupos empresariais que possuem operações em diferentes países e necessitam de um mecanismo padronizado para garantir a conformidade com a legislação de proteção de dados.
Entre os setores que podem se beneficiar desse modelo, destaco:
- Empresas multinacionais – Grupos que operam em diversos países e precisam compartilhar informações de clientes, funcionários e fornecedores.
- Empresas de tecnologia e serviços digitais – Plataformas que possuem data centers, servidores e usuários espalhados pelo mundo.
- Empresas do setor financeiro – Instituições que precisam transferir dados para análises de risco, compliance e prevenção a fraudes.
- Empresas de logística e comércio exterior – Organizações que lidam com dados sensíveis de remessas internacionais e precisam garantir transparência nas operações.
Com a adoção das NCG, essas empresas reduzem barreiras regulatórias e garantem que a proteção de dados seja aplicada de forma consistente, independentemente do país onde estão operando.
Sua empresa poderia utilizar Normas Corporativas Globais?
Se sua empresa realiza transferências frequentes de dados internacionais, vale considerar a possibilidade de implementar as Normas Corporativas Globais como uma solução mais flexível e abrangente do que os tradicionais contratos individuais.
Algumas perguntas podem ajudar a avaliar se essa abordagem é ideal para o seu negócio:
- Sua empresa possui filiais ou subsidiárias em diferentes países?
- A movimentação de dados internacionais é parte essencial da sua operação?
- A necessidade de assinar cláusulas contratuais-padrão para cada transferência gera burocracia excessiva?
- A empresa tem um time de compliance preparado para implementar e monitorar as Normas Corporativas Globais?
- Seus parceiros internacionais já utilizam NCG ou possuem certificações equivalentes no GDPR?
Se a resposta for sim para a maioria dessas perguntas, as NCG podem representar um avanço significativo na estratégia de governança de dados da sua empresa.
Empresas que optam por esse modelo conseguem simplificar suas operações, reduzir riscos regulatórios e garantir que suas práticas de proteção de dados sejam reconhecidas globalmente.
Com o avanço das regulamentações de proteção de dados ao redor do mundo, as Normas Corporativas Globais estão se tornando um padrão cada vez mais adotado por grandes organizações. O Brasil, com a regulamentação da ANPD, já dá passos importantes para permitir que empresas interessadas possam estruturar esse modelo de forma segura e eficiente.
Se sua empresa ainda não avaliou essa possibilidade, agora é o momento de considerar essa alternativa e garantir mais segurança jurídica para as suas transferências internacionais de dados.
